Por Joana Patacas*, em 10 de maio de 2024
A aclamada acordeonista Inês Vaz regressa ao panorama musical com o seu segundo álbum intitulado "Pétala", lançado a 10 de maio.
Inspirado pelo poema “Até chegar a mim” de Maria Teresa Horta, este novo trabalho discográfico segue o sucesso do seu álbum de estreia "Timeless Suite", onde explorou as capacidades narrativas do acordeão através de obras de diversos compositores clássicos, como Bach, Scarlatti, Rossini, Beethoven, e de duas obras inéditas da sua autoria – “Timeless Suite” e “Waiting Room”.
Em "Pétala", Inês Vaz mantém a centralidade no acordeão mas enriquece a sua expressão ao integrar elementos de poesia e voz, contando com a colaboração de artistas como Jacqueline Fernandez, José Rodrigues Cardoso e Natália Luíza. O álbum propõe uma fusão entre música e literatura, onde poemas de Francisca Aguirre, José Rodrigues Cardoso e Maria Teresa Horta se entrelaçam com peças musicais de Inês Vaz, Astor Piazzolla, Brad Mehldau, Maurice Ravel, Modest Mussorgsky e Vladislav Zolotaryov.
A artista descreve "Pétala" como uma viagem através da leveza e da delicadeza da mesma, onde cada faixa serve como uma reflexão sobre a humanidade e a fragilidade interior. O álbum é apresentado como uma "página livre", convidando o ouvinte a imaginar e interpretar cada composição de maneira pessoal e íntima.
Este lançamento promete ser um marco importante na carreira de Inês Vaz, consolidando a sua posição como uma das mais inovadoras intérpretes no campo da música clássica e contemporânea em Portugal.
Acompanhe-nos na entrevista exclusiva à ProART com Inês Vaz, conduzida por Joana Patacas, onde a artista partilha reflexões sobre o processo criativo por trás de "Pétala" e o significado mais profundo deste trabalho tão pessoal e ambicioso.
Em que é que se inspirou para desenvolver o conceito e a narrativa do álbum "Pétala"?
O conceito e a narrativa do álbum "Pétala" surgiram de forma extremamente espontânea. Foi um caminho de estudo e criação que durou cerca de dois anos, durante os quais, de repente, entre peças que estava a estudar, outras que estava a compor e poemas que fui lendo e que, de alguma forma, ecoaram em mim durante algum tempo, tudo se uniu de forma tão natural que o seu alinhamento parecia contar uma história.
Como é que o poema "Até chegar a mim" de Maria Teresa Horta influenciou o desenvolvimento do álbum?
Algures a meio do processo, surgiu o poema "Até chegar a mim" de Maria Teresa Horta, e ao ler os versos finais "... pétala após pétala | após pétala | até chegar a mim...", foi como se o nome do disco me tivesse sido oferecido de forma leve e simples, exatamente como uma pétala que flutua ao sabor do vento. A partir daí, pensei que faria sentido dar cor, definição e intensidade à narrativa de forma mais orgânica, através de outros apontamentos poéticos que, como já referi, pareciam dar seguimento a esta "pétala" inicial, criando um fio condutor, que entrelaçava as peças instrumentais, que iam sendo definidas ao mesmo tempo.
Quais são os diferentes estágios da narrativa que compõem "Pétala"?
É como se o disco estivesse dividido em três estágios do ser humano. Uma primeira parte, que representa um início de viagem, onde existe um despertar para o mundo (peça “Ítaca”, inspirada no poema homónimo de Konstantinos Kaváfis), um lado mais infantil e inocente, de um início de vida ou caminho, representado por alguns dos quadros de “Quadros de uma exposição” de Modest Mussorgsky. Entretanto, com o surgir do poema "Contradições" de Maria Teresa Horta, recitado por Natália Luíza, descobrimos um lado mais negro e sombrio, repleto de noite, abismos e escuridão. Aprendemos a atribuir significados ao mundo, a refletir sobre ele, a observá-lo, a pensá-lo e a conhecê-lo. Por vezes, encontramo-nos num labirinto sem saída — confrontados com um país em guerra, as nossas lutas interiores, a procura de uma vida melhor e a gestão das questões laborais — sentindo uma angústia que nos impulsiona a seguir um caminho "Perpendicular". Neste caminho, desesperadamente procuramos uma porta onde bater. Quando esta se abre, conseguimos finalmente reencontrar a nossa voz numa viagem tortuosa e desmedida, conforme retratado no poema "Desmesura" de Francisca Aguirre, recitado por Jacqueline Fernandez. No final, no terceiro estágio, vivenciamos um momento de despedida, acolhendo a tristeza através do poema "Bonjour Tristesse" de José Rodrigues Cardoso, recitado pelo próprio. Aprendemos que a tristeza é uma das nossas "pétalas" perenes, mas que apesar dela continuamos vivos e capazes de olhar para o mundo e para nós mesmos com curiosidade e esperança. Por fim, despedimo-nos das pétalas caducas que se libertaram de nós ao longo da viagem, simbolizado por "Adiós Nonino" de Astor Piazzolla. A narrativa é livre, e nota após nota, palavra após palavra, cada um poderá fazer a sua leitura, imaginar a sua história e redefinir todos os capítulos. Quem tiver acesso ao disco em formato físico poderá ainda ler um belíssimo prólogo de Ana Lázaro, que descreve a metamorfose da "pétala" de forma magnífica.
Como é que descreve o som e estilo musical deste novo trabalho em comparação com seu álbum anterior "Timeless Suite"?
Comparativamente com o meu primeiro álbum, este apresenta uma sonoridade um pouco mais contemporânea, resultado da escolha de compositores de épocas mais recentes e pelo facto de incluir mais peças da minha autoria. Embora o acordeão se mantenha como elemento central, neste álbum juntei poesia e voz através da participação dos convidados Jacqueline Fernandez, José Rodrigues Cardoso e Natália Luíza, que contribuem para uma narrativa mais orgânica e que o enriquece com cor, definição e intensidade.
Há alguma faixa ou composição em particular no álbum que tenha um significado especial para si?
Todas as peças e poemas têm um significado especial. Gostaria de referir em particular a peça “Partir, Revenir” que é a primeira de uma série de vídeos que irei partilhar. Esta peça foi inspirada em três estações ferroviárias abandonadas no Alentejo e no livro “Levantado do chão” de José Saramago, que estava a ler na mesma altura em que visitei essas estações. Nela, tento espelhar o imaginário das lutas dos trabalhadores rurais nos latifúndios, descritos no livro, e a dureza e desumanidade inqualificáveis de se ser tratado como escravo sob um regime ditatorial. Muitas vezes, os raros momentos de alegria aconteciam ao fim do dia nas tabernas. Para muitos, a última e única esperança era emigrar em busca de uma vida melhor, embora sempre com uma ideia de mais tarde ser possível regressar (revenir).
Já estão programados concertos ao vivo para a divulgação do álbum?
Por enquanto ainda não está programado nenhum concerto para a divulgação do álbum, mas é algo que faz parte dos próximos passos, que irei começar a preparar.
*Ilustração do álbum "Pétala" por Patrícia Roque
Joana Patacas - Assessoria de Comunicação e de Conteúdos
Quer saber mais? Veja abaixo e ouça a música "Ítaca", a 2ª faixa do álbum "Pétala", composta por Inês Vaz:
Poderá encontrar mais informações sobre Inês Vaz em:
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Leia também a entrevista ProART a Inês Vaz aqui.